Refúgio do Sol
Sítio Solzinho, Arajara, Barbalha (CE)
+
Obra construída
Premiação IABCE de arquitetura, 2023
na categoria Edificações
POR MAIS LICENÇAS[1] POÉTICAS[2]: quando a arquitetura (corpo, território, projeto, construção, obra em contínua transformação) passeia entre devaneios poéticos e as realidades do habitar. A poesia presente[3] no Refúgio do Sol[4].
[1] pedir "licença" para entrar é uma expressão coloquial e envolve não apenas a licença ao anfitrião, como também ao lugar compreendido como paisagem, natureza, orixás...
[2] POR MAIS LICENÇAS POÉTICAS é quase um manifesto que busca trazer à tona a crise que o ser humano e a arquitetura vêm passando. Quando definimos, de forma muito superficial e equivocada, a arquitetura em parte artística e parte técnica rompemos o elo radical (que vem da raiz) que dá significado à vida. Não somos parte sentimentos e parte razão. Somos essa mistura indissociável.
[3] O presente empregado tem um que poético também de revelar a importância do estado de PRESENÇA, cada vez mais a substituído pela VIRTUALIDADE.
[4] A expressão REFÚGIO DO SOL carrega várias poéticas: (a) o elemento SOL que rege a vida no dia instituindo o tempo, o acordar e o dormir; (b) o REFÚGIO como a busca pela essência do abrigar, mais simples, mais essencial a vida, sem excessos; (c) o REFÚGIO DO SOL como aquele elemento que acompanha de um lado o nascer e do outro o pôr do sol (esses lados marcados pela terra da taipa de pilão que se encontra alinhada constituindo esses lados).
A obra Refúgio do Sol (ago./2020 a set./2021) com 62m2, localizada no Sítio Solzinho, zona rural do município de Barbalha (CE), na Chapada do Araripe, trouxe uma mistura de técnicas construtivas na busca por uma melhor relação da presença humana (conforto ambiental) com a natureza e seus fenômenos (sol, ventos, clima, tempo, paisagens, águas, vegetação).
O Sol, da iluminação natural a marcação da passagem do ciclo do dia. Sol é vida e ao mesmo tempo, em certos momentos do dia é calor escaldante e assim requer proteção, abrigo. O Sol da manhã atravessa as aberturas através da pele de esquadrias e vidros. O Sol da tarde será recebido pela parede de taipa de pilão com 40cm de espessura mantendo a casa confortável. Ao anoitecer a casa devolve, ao descanso do sol, a luz que iluminará os vários níveis de jardins que a envolve.
O lugar nos deu indícios dos materiais a serem escolhidos, a partir da sua ABUNDÂNCIA. No terreno, a riqueza de terra foi determinante para a escolha desse elemento como material predominante para a construção das vedações da casa, em duas formas: taipa de mão e taipa de pilão. Essas técnicas resgatam o fazer das tradições populares da região.
Taipa de Pilão: uma parede de 0,40 x 8,0 x 5,0m na direção norte-sul, protege a insolação poente através da sua elevada capacidade em promover inércia térmica.
Argamassa Armada: técnica difundida na construção das cisternas no sertão nordestino. Foi utilizada para acomodar o bloco hidráulico destacado pela cor azul (cor definida pelo morador ser filho de Iemanjá), garantindo pequenas espessuras de paredes (0,10m), plasticidade e resistência as águas. Nesse processo a arquitetura é delicadamente costurada: malha plástica e vergalhões, que são base estrutural do processo, para o recebimento da mistura de cimento, água, areia e agregados miúdos.
Taipa de Mão: utilizada para as outras vedações, foram construídas no período de uma manhã através de um processo de mutirão.
Como forma de tratamento das águas de pias e bacias utilizamos, respectivamente, um círculo de bananeiras e uma bacia de evapotranspiração.
O processo de construção artesanal permitiu que todos os envolvidos na obra e passantes vivenciassem cada etapa como um canteiro experimental que proporcionou a construção de muitos aprendizados e trocas de conhecimentos.
“A arquitetura é nosso principal instrumento de relação com o espaço e o tempo, e para dar uma medida humana a essas dimensões, ela domestica o espaço ilimitado e o tempo infinito, tornando-o tolerável, habitável e compreensível para a humanidade.”
Juhani Pallasmaa.
FICHA TÉCNICA
Arquitetes
André Moraes e Carolina Mapurunga
Estagiárias de arquitetura
Andressa Gomes
Bioconstrução
João
Francisco
Pedrinho
Ciçô
Mutirão taipa de mão
Alane, Jó, Jeez, Paulinho, Francisco, Jefferson, Andressa, João, Carol, André, Pedrinho, Ciçô
Tijoleira
Paulo
Esquadrias
Madeireira Santa Edwirgens
Vidros
Ney e Guilherme
Serralharia
Francisco
Cantaria dos muros e pintura
Marcos
Pintura das portas
Valmir
Granito
Jane
Ladrilho hidráulico
Mestre Jaime
Clientes
Glauberto e Marcos
Fotografia
Igor Ribeiro